quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Cinema Nômade com Francis Ford Copolla


Rumble Fish (peixe de combate), filme de Coppola renomeado na tradução brasileira como O Selvagem da Motocicleta, traz a superfície o problema das vidas de uma juventude encurralada numa atmosfera urbana própria para enfraquecer, capturar e tornar o desejo dependente. O motor abstrato da sociedade, o capital e suas trocas esterilizantes e niveladoras, se insinuam como pano de fundo de uma tragédia urbana. Vidas em busca de motivos que tornem o existir interessante, em contínua variação; uma procura desesperada pelas zonas relacionais de intensidade manchadas por uma paisagem povoada por trapos humanos. Os meios de diferenciação, os dispositivos de combate, as conquistas de modos intensivos de ser, tudo isso escapa a tipos que só encontram prazer ou saída na vida em dissolução, nos afetos que ao preencherem-na operam como entorpecimento, como desvio de si e resposta às dores e sofrimentos intoleráveis e sem sentido, exceto o de fazerem o homem se render, cansado e sem pespectiva, ao conformismo generalizado dos impotentes, de uma sociedade fraca. Vivos aos trapos, separados da capacidade de situarem-se num campo fatídico de forças trituradores de desejos e portanto longe de verem-se cúmplices e/ou protagonistas de usas cadeias e tomados de dentro como elementos do próprio problema que os coage. Territórios em decomposição servem de arapucas, orquestradas imperceptivelmente por linhas de força daquele poder que faz das paixões tristes o maior de todos os negócios, o negócio dominante que quer se fazer passar por vida, mas que não pode fazê-lo sem rebaixá-la, sem vergar e substituir a vida intensa, como uma pálida lembrança da vida, como narcótico e esquecimento maior da própria morte em vida. Para modos impulsivos de viver impõe-se criar expressividade a todo o custo, traçando linhas mortíferas de fuga. Mas então só resta o confronto, a desistência, a morte. O jovem da motocicleta difere, intempestivo e precipitador. Vislumbra linhas de fuga que ele mesmo, pessoalmente, já não pode mais traçar. Rasga no fundo cinza de uma humana natureza morta, criando uma paisagem de cores à qual já não pode mais juntar-se. (Luiz Fuganti)