
Em uma formação social despótica romana, um corpo intenso, uma natureza que salta, um pensamento alegre na destruição. Extraindo humor das práticas de maldade como dispositivo provocador e redisponibilizador das forças de um corpo social decadente, que apodrece e se desmancha lascivamente. Caligula se constrói num meio cujo horizonte constitutivo oscila entre a trapaça covarde da existência impotente e a traição paranóica. Cruel? Louco? O Terror em pessoa? O arbítrio aterrador em estado puro? Uma necessidade implacável de fazer comandar o Imponderável e fazer de si um Destino, se fazer Divino! Em um meio no qual os poderes de rebaixamento da vida triunfam a cada complô!
O erotismo como dispositivo que escancara um diagrama de forças, catalizador de afetos que escapam ou são capturados no tecido de um corpo pleno despótico. O sexo hipostasiado em práticas eróticas que fazem explodir o desejo como linha de fuga, glorificando o gozo nos modos de investir e destruir os lugares de poder. Calígula, déspota e escravo que está em nós? Vemos brotar nesse meio traços e tendências que se repetem em um regime de autoridade e que constituem o cinismo moderno das nossas sociedades. O épico-erótico de Tinto Brass reflete a gênese da nova aliança de comando do desejo com a Transcendência nas figurações teatrais e plásticas do fazer do déspota: a filiação direta com Deus transfigura e transporta a relação com um fluxo germinal intenso. Uma adestramento dos esfíncteres, uma retenção de fluxos, uma transgressão incestuosa. Eis o modo Calígula-Estado paranóico e despótico.

